“Existe um livro na minha cabeça e coração, implorando para ser criado.”
Dostoiévski começou a escrever “Os Irmãos Karamázov” em 1878.
O livro, que já vinha se formando e maturando no seu espírito fazia dois anos, começou a sair-lhe da pena com uma facilidade impressionante.
Agora, sim, tudo daria certo. Dostoiévski enfim conseguiria escrever em condições melhores, sem (literalmente) passar fome ou trabalhar sob prazos criminosamente curtos, explorado por algum editor mesquinho.
O livro parecia escrever-se sozinho, sob o influxo do gênio criativo de Dostoiévski, agora no seu auge: o escritor, plenamente maduro, dominava todas as técnicas e retivera todas as experiências necessárias à criação daquele livro descomunal e milagroso.
A fé, a razão, Deus, a morte, a eternidade, o sofrimento e o amor — Dostoiévski estava pronto para escrever sua obra-prima…
Até que a vida aconteceu.
Ou, melhor dizendo: a morte.
“Meu querido irmão Nikolai. Nosso Aliosha morreu hoje de um ataque súbito de epilepsia; ele nunca tinha sofrido da doença antes. Ontem, ainda estava se divertindo, correndo para lá e para cá, cantando, e agora está morto. O ataque começou às 9h30 e às duas e meia da tarde nosso pequeno Aliosha estava morto…”
Aliosha, o filho de três anos de idade de Dostoiévski, morreu. Tinha sido o seu filho favorito; o menino que o escritor tinha certeza ter herdado seu talento. Seria um gênio, como o pai!
Tinha herdado outra coisa: sua epilepsia. E ela foi fatal.
Não é à toa que Dostoiévski dá ao herói de Os Irmãos Karamázov o nome de “Aliosha”. Não foi à toa que Dostoiévski transformou o sofrimento de crianças inocentes no argumento principal de Ivan contra Deus — nem que tenha conseguido transmiti-lo com tanta força.
O próprio Dostoiévski sofreu com aquelas dúvidas. O próprio Dostoiévski quis perder a fé e entregar-se ao niilismo. Dostoiévski tinha sido Ivan. Dostoiévski tinha sido Dmitri. Dostoiévski tinha perdido seu Aliosha.
“Os Irmãos Karamázov” não foi um livro escrito dentro dum escritório com ar-condicionado, por alguém que nunca sofreu na vida.
Foi escrito com o coração despedaçado de alguém que perdeu o próprio filho. De alguém que foi preso e exilado por dez anos. Que perdeu mãe e pai na infância. Que perdeu esposa. Perderia filhos e o irmão. Que perdeu quantias incomensuráveis de dinheiro na jogatina.
Mas nunca perdeu uma coisa: sua fé.
E Deus não lhe deixou faltar o talento.
Hoje, às 19h, vou dar uma aula aberta sobre a obra-prima máxima de Dostoiévski: “Os Irmãos Karamázov”.
Será uma das melhores aulas que já dei na minha vida. Como eu sei? Já a dei uma vez.
No final, abrirei as inscrições para a próxima turma do meu Clube de leitura dos clássicos — com uma condição especial para quem estiver ao vivo.
Esteja com a gente hoje, entrando no Clube ou não. Você não vai se arrepender:
Raul você é excepcional. É sempre uma aventura ler cada texto que escreve.